O que mais a impressionou no passeio foi a miséria geral, a falta de cultivo, a pobreza das casas, o ar triste, abatido da gente pobre. Educada na cidade, ela tinha dos roceiros idéia de que eram felizes, saudáveis e alegres. Havendo tanto barro, tanta água, por que as casas não eram de tijolos e não tinham telhas? Era sempre aquele sapé sinistro e aquele sopapo que deixava ver a trama de varas, como esqueleto de um doente. Por que ao redor dessas casas não havia culturas, uma horta, um pomar? Não seria fácil, um trabalho de horas? E não havia gado, nem grande nem pequeno. Era raro uma cabra, um carneiro. Por quê? Mesmo nas fazendas, o espetáculo não era mais animador. Todas soturnas, baixas, quase sem o pomar olente e a horta suculenta. A não ser o café e um milharal, aqui e ali, ela não pôde ver outra lavoura, outra indústria agrícola. Não podia ser preguiça só ou indolência. Para o seu gasto, para uso próprio, o homem tem sempre energia pra trabalhar. As populações mais acusadas de preguiça trabalham relativamente. Na África, na Índia, na Conchinchina, em toda a parte, os casais, as famílias, as tribos, plantam um pouco, algumas coisas para eles. Seria a terra? Que seria? E todas essas questões desafiavam a sua curiosidade, o seu desejo de saber, e também a sua piedade e simpatia por aqueles párias, maltrapilhos, mal alojados, talvez com fome, sorumbáticos!...
Lima Barreto, O triste fim de Policarpo Quaresma, Capítulo 3, 2ª parte, pág 110.
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